O emblema que nunca foi

Estávamos no início de 2007. Fernando Rocha havia assumido a direção do clube em outubro de 2006, tendo destronado em acto eleitoral João Sintra.
O histórico emblema do Portimonense permanecia inalterado desde a sua génese, exceptuando alguns detalhes gráficos que os jornais desportivos desenharam autonomamente nos anos 70 e 80 para usufruto nas suas publicações, pois ainda estava longe o advento do design gráfico digital.
Se já achamos peculiar a forma como (não) são apresentados os equipamentos do Portimonense hoje em dia, recordo que a 18 de janeiro de 2007 — sim, a meio da temporada! — foram publicamente apresentadas novas indumentárias desportivas.
A principal novidade seria a troca de fornecedor, pois o Portimonense iria voltar a vestir Nike. Seria, não fossem os equipamentos conter uma novidade ainda mais relevante: um novo e estranho emblema.
A intenção da nova direção era clara: incluir o nome ‘Portimonense’ no símbolo e substituir a águia que lá estava, uma águia genérica e que não tinha qualquer ligação com o clube ou com a região.
Até aqui tudo bem. Problema: os equipamentos com o novo emblema já estavam cá fora, mas o símbolo em questão não fora aprovado em Assembleia Geral pelos sócios. O Portimonense jogou mesmo várias partidas do campeonato com um escudo ao peito que nunca existiu (!), estatutariamente falando.
A AG para discussão do novo emblema aconteceu a 22 de fevereiro de 2007, onde foi apresentada a proposta que já constava nas camisolas e que contemplava a alteração à forma do escudo, a inclusão da águia perdigueira (também conhecida como águia-de-bonelli, uma espécie autóctone do sul de Portugal), a palavra PORTIMONENSE, maiúscula, ao cimo do escudo e um padrão de fino riscado vertical, a preto e branco.
Esta proposta gerou desde a primeira hora controvérsia entre os sócios, pois além de romper abruptamente uma tradição icónica, violava os estatutos do clube, que são claros sobre o símbolo: “a águia sobre o escudo e as iniciais P S C entrelaçadas”. Ressalva que foi feita, aliás, por um dos mais antigos colaboradores deste Blog, presente nessa Assembleia, Ruben Miquelino.
Para que a proposta apresentada pela direção avançasse, seria necessário alterar os estatutos, o que iria atrasar o processo, pelo que a opção tomada foi a de redesenhar o emblema.
A versão final, que hoje tão bem conhecemos, viria a ser oficialmente apresentada aos sócios e adeptos no dia 25 de fevereiro de 2007, perante um estádio praticamente esgotado, através de uma lona gigante colocada no relvado — numa partida frente ao Vizela que acabou num empate 0-0.
Apesar de oficializado o novo escudo do Portimonense, a equipa continuou a jogar até final da época com os equipamentos do emblema “irregular”. Já que estão feitos, mais vale aproveitar — terá pensado a direção.
Com este emblema ao peito, a equipa viria inclusive a vencer a Taça da AF Algarve 2007, batendo o Louletano por 3-1 no Estádio Algarve.
A 9 de julho, aquando da apresentação do Portimonense para a época 2007/08 (evento que aconteceu no Auditório Municipal e cuja falta de continuidade só podemos lamentar), o escudo irregular ainda figura nos equipamentos.
Usado ainda na pré-época, o emblema definitivo viria a ser implementado nos jogos oficiais a partir de agosto de 2007. Mas ainda foram seis meses a envergar o emblema que nunca foi.
Por terem tido uma existência tão efémera e serem objecto de um episódio tão caricato da nossa história, estas camisolas de 2007 são certamente das mais raras do nosso Portimonense (e sim, eu sei que podemos dizer isto de qualquer camisola do Portimonense). Mas estas testemunham uma fascinante ilegalidade, são uma preciosidade museológica que, confesso, pagaria bem para ter em minha posse. Fica a dica. E a história.